A grandeza do serviço
"Senhor, tu lavas-me os pés a mim?" (Jo 13:6)
Não conseguimos entender a completa profundidade que este
versículo alude. Ele remete a uma cena, descrita no capítulo 13 do evangelho de
João, em que Jesus Cristo se levanta da ceia, toma uma toalha, coloca água numa
bacia e passa a lavar os pés dos seus discípulos e a enxugá-los. Sobre este
costume da época, William Hendriksen¹ comenta:
“Os pés, protegidos apenas por sandálias, ficavam parcialmente expostos à areia e poeira. Eles estavam sujos ou pelo menos desconfortáveis. Nessas circunstâncias, a lavagem dos pés era um costume. O anfitrião, embora pessoalmente não realizasse essa tarefa (Gn 18.4; Lc 7.44), em geral tomava as providências para que fosse feita. Era, no final das contas, uma tarefa servil, ou seja, um a tarefa a ser feita por um criado [...] Mas aqui no Cenáculo não havia servo. Portanto, um dos discípulos teria de realizar essa tarefa. Mas nenhum deles teve disposição. Esses homens eram muito orgulhosos.”
Nenhum dos discípulos ali presentes teve a atitude de lavar
os pés uns dos outros, mesmo sabendo que era necessário, por virem este ato
como algo humilhante. Eles já haviam
questionado ao Senhor sobre quem dentre eles seria o maior (Lc
9:46). Logo, o orgulho estava impregnado no coração de cada um
deles.
Porém, Jesus, o Filho de Deus, decidiu fazer isso! Nesta
cena, percebemos a tamanha humildade daquele que temos como Senhor. Vemos a
divindade se curvando à humanidade! O Criador de todas as coisas se curvando à
criatura, em um ato de profunda humilhação. O Santo se curvando diante de
pecadores, de homens cheios de orgulho, inclusive o seu traidor também estava
ali, e Ele lavou os seus pés!
O Mestre com esta atitude exótica, estava tentando ensinar
aos seus discípulos que na dinâmica do Reino, o maior é aquele que serve. Após
lavar os pés dos discípulos, Ele disse:
“Compreendeis o que vos fiz? Vós me chamais o Mestre e o Senhor e dizeis bem; porque eu o sou. Ora, se eu, sendo o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.”
A grandeza do Reino não consiste em sermos servidos, mas em
servirmos aos outros, assim como o próprio Senhor Jesus.
“Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo.” (Mt 20:25-27)
O Reino possui valores diferentes e contrários aos deste
mundo e como discípulas de Jesus precisamos expressar estes valores. Ao invés de
centralizarmos em nós mesmos, em nossas necessidades e anelos, precisamos
aprender a focar no próximo, expressando amor, ainda que em um mundo repleto de
ódio e egoísmo.
Podemos pensar no quanto isso é difícil e no quanto muitas
vezes preferimos ser as primeiros e as importantes. Mas, podemos refletir:
como o servo poderia desejar ser servido em um mundo onde o seu Senhor serviu?
Como o discípulo ousaria viver outra coisa além daquilo que o seu Mestre
ensinou com a sua vida?
“Lavar os pés de outro crente está abaixo de minha dignidade”. Se não estava abaixo da dignidade do Senhor, certamente não deve ser considerado como abaixo da dignidade do ‘servo’”¹
Um dia, Ele nos amou e veio ao nosso mundo, se humilhando de
tal forma que se fez como um de nós (Fp 2:6-8). O Santo e Unigênito Filho de
Deus entregou a sua vida pelos pecadores, e morreu como um malfeitor em uma
cruz por buscar o nosso bem. Agora, Ele diz: Vão e façam o mesmo pelos outros!
“É assim que conhecerão que vocês são meus discípulos, se tiverdes amor uns
pelos outros” (Jo 13:35).
Conforme o Mestre, não nos reconhecerão como seguidores de
Jesus pela multidão que nos ouve, pelas almas que ganhamos para Ele, pelo
ministério, pregações, sinais, ou qualquer outra coisa que fizermos, se não
pelo amor demonstrado pelos outros, como Ele um dia demonstrou por nós.
“Amem uns aos outros, como eu vos amei.” (Jo 13:34)
Um amor altruísta e sacrificial, que não pede nada em troca,
mas que se compraz em fazer o bem do outro, independente de que se este mereça
ou não.
Jesus também disse que é nisso que consistirá a nossa
felicidade, quando praticamos o que Ele nos ensinou (Jo 13:17). Então seremos
bem-aventurados!
Procuremos, então, oportunidades de servir e de expressarmos
amor pelo próximo, sabendo que é nisto que está a nossa honra conforme o
Senhor, de onde vem o padrão que devemos nos espelhar. E mesmo que seja
difícil, Ele nos concederá forças para vencermos a nós mesmos e à nossa
natureza depravada quando as buscarmos Nele, a fim de cumprirmos a sua vontade
em nossas vidas. Quando formos assim, não seremos nada menos do que como o
próprio Senhor Jesus é, sendo identificado como seus discípulos no mundo, e
bem-aventurados conforme a Sua promessa!
Thayse Fernandes
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¹ HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento:
exposição do evangelho de joão. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
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