A idolatria no encanto
Na história em quadrinho “Coringa”¹ há um personagem secundário que narra
todos os acontecimentos. Ele se chama Jonny Frost. Frost é um bandido que foi
preso algumas vezes. Porém, em liberdade, colocou-se na missão de buscar o
Coringa, que havia acabado de receber alta do asilo Arkham. Acredito que muitos
conhecem quem é Coringa, mas vou citar algumas características desse personagem
icônico. Coringa é um atípico fora da lei, autor de diversas atrocidades na
cidade de Gotham, com a sua mente assassina e doentia, ele conquistou o posto
do maior vilão das histórias do Batman.
Mas, vamos voltar a falar sobre Jonny Frost, o mero coadjuvante. Depois
que foi buscar o Coringa no asilo, Frost o viu realizando inúmeras maldades
pela cidade e acompanhou os comportamentos do grande vilão contra os seus
inimigos. Inclusive, Coringa muitas vezes ofereceu perigo para o próprio Jonny.
Contudo, ao invés de se afastar daquele homem vil e insano, devido ao seu
coração mau, Frost se viu totalmente encantado pelas condutas cruéis e iniciou
o seu desejo de ser alguém semelhante ao Coringa. Acredite, ele via vantagens
nisso. Tornar-se um bandido ainda melhor e ser respeitado eram as suas
ambições.
Claramente, os seres humanos se deixam encantar por diversas coisas. Não
há nada de errado com isso. Pelo contrário, é uma das experiências humanas mais
belas. Quando nos encantamos pela chegada de um bebê à família, ou quando vemos
o mar pela primeira vez (ou depois da vigésima vez), ou ainda,
quando nos encantamos com homens e mulheres que são exemplos para seguirmos.
Contudo, o nosso coração costuma falhar. Rapidamente ele pode encher-se de
idolatria ao encantar-se com o que há ao nosso redor.
“Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jeremias 17:9)
Os ídolos podem nos acompanhar em nossas experiências de encantamento. Na
história que citei, por admirar a vaidade, a maldade, a arrogância e o próprio
ego, Jonny Frost se encanta com o único homem que estava a sua volta e possuía
ídolos semelhantes em seu coração. Ao estarmos encantadas com a nossa
inteligência ou mesmo com pessoas que admiramos, por exemplo, podemos colocar
nestes objetos a nossa confiança. O nosso coração pode se prender facilmente às
coisas criadas e deixar de lado o Criador, pois ao invés de reverenciarmos
apenas o nosso Deus, o nosso coração encontra gozo em ídolos criados (não
necessariamente ídolos materiais) e a nossa alma não mais crê na suficiência do
Senhor em nossa vida. Com isso, caímos na idolatria (Romanos 1).
Vamos observar três situações que ocorreram com outro personagem bastante
conhecido por nós, o jovem rico (Marcos 10:17-31). Esse jovem também caiu no
pecado da idolatria ao deixar que o amor direcionado aos seus encantos, neste
caso, os seus bens materiais, fosse maior que o seu próprio amor a Deus.
Primeiramente, quando o objeto do nosso encanto se torna um ídolo em nosso
coração, não depositamos a nossa confiança no Senhor. O moço cheio de riquezas,
ao ser chamado para estar junto do Mestre, preferiu permanecer ao lado da fonte
que lhe trazia confiança: os seus bens.
“E Jesus, fitando-o, o amou e disse: Só uma coisa te falta: Vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; então, vem e segue-me. Ele, porém, contrariado com esta palavra, retirou-se triste, porque era dono de muitas propriedades.” (Marcos 10:21-22)
A segunda coisa que pode acontecer conosco quando o nosso coração se
enche de vaidade e o objeto de nosso encanto nos preenche, é termos o nosso
relacionamento com Deus abalado. Apesar de compreender os mandamentos desde a
sua mocidade e de buscar o Senhor Jesus para entender melhor sobre o Reino e a
vida eterna, aquele jovem foi drasticamente impedido de se relacionar
verdadeiramente com o Mestre, segui-Lo e aprender com Ele, porque as suas
muitas propriedades estavam arraigadas em seu coração (Marcos 10:21-22).
E, por último, quando o nosso encantamento pelas coisas criadas se torna
um encanto idólatra, nunca seremos felizes. Nós nascemos para glorificar o
nosso Deus e vivermos felizes ao seu lado (Isaías 43:7; Salmos 16:11). Logo,
quando não vivemos essa realidade para a qual fomos criadas, não conseguimos
desfrutar da verdadeira alegria. E, ao nos depararmos com o nosso Deus e sua
Verdade, nos entristecemos e nos retiramos, como fez o jovem. Pois,
não conseguimos nos desprender dos nossos ídolos e o encanto por eles faz com
que a nossa vida não seja plena em Cristo (Marcos 10:22).
Frost e o jovem rico nos mostram como o encanto pelas coisas desta vida
pode nos surpreender sutilmente e nos levar ao pecado da idolatria,
afastando-nos da presença do nosso Deus Pai. Que nós possamos desfrutar das
obras criadas pelo nosso Deus sem torná-las a razão de nossa existência. Que
venhamos a nos encantar apenas pelo que é bom e deixar de lado tudo o que Deus
rejeita. Oremos para que possamos ser vigilantes e cuidadosas com o nosso
coração e todos os nossos encantamentos. Peçamos ao Senhor um coração
semelhante ao Dele e que Ele nos guarde de toda idolatria. Como filhas, que
busquemos encontrar apenas Nele a suficiência.
“Eu te busco de todo o coração; não permitas que eu me desvie dos teus mandamentos. Guardei no coração a tua palavra para não pecar contra ti.” (Salmos 119:10-11)
“Acima de tudo, guarde o seu coração, pois dele depende toda a sua vida.” (Provérbios 4:23)
“Meu filho, dê-me o seu coração; mantenha os seus olhos em meus caminhos.” (Provérbios 23:26)
“Filhinhos, guardem-se dos ídolos.” (1 João 5:21)
Hellen Juliane
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1 AZZARELLO, Brian. Coringa. São Paulo: Panini Books, 2011.
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