A autossabotagem e seus males
A autossabotagem é
uma daquelas palavras que não ouvimos com muita frequência em nosso dia a dia,
mas que é bastante comum em nosso tempo. Ela pode ser definida como a ação
negativa que infligimos sobre nós mesmos ou o comportamento consciente ou
inconsciente de não se permitir cumprir seus objetivos, o que envolve
uma série de comportamentos danosos como a procrastinação, medo, comparação,
perfeccionismo, sentimentos de inferioridade, autocrítica, etc. Percebe-se que
o que afeta o indivíduo não vem necessariamente de fora, mas dele mesmo, o que
é consequência de sua maneira distorcida de enxergar a si mesmo e o mundo à sua
volta.
Quantas vezes não
nos permitimos avançar pelo receio do julgamento alheio ou por causa de um
padrão elevado que temos sobre nós, que nos impede de nos enxergarmos capazes
para muita coisa na vida? Quantas vezes o medo veio para nos estagnar quando
diante dos nossos sonhos ou até mesmo a comparação com outras vivências que
consideramos além da nossa realidade? Quantas vezes mostramos misericórdia e
paciência para outras pessoas, mas não conseguimos estender esta mesma
misericórdia e paciência sobre nós mesmos? Em vez disso, impomos autocrítica e
padrões perfeitos. Podemos estar diariamente convivendo com a autossabotagem sem
sequer percebermos o quanto estamos sendo afetados por ela.
Meu desejo é que, ao
ler esse texto, você se torne consciente dessa malevolência para que então
possa tomar iniciativas que te ajudarão a dominá-la. Não pretendo te dar uma
fórmula mágica, um conjunto de passos ou segredos para isso, mas te encorajar a
lidar com o seu processo e a ser paciente com ele. Muitos resultados não vêm de
uma hora pra outra, como num abrir e fechar de olhos, mas no progresso de dar
um passo de cada vez, construindo tijolo após tijolo, vivendo o processo.
A primeira atitude é
justamente essa, tornar-se consciente do que está acontecendo e o porquê. Pare
e pense nos motivos que em algum momento te impediram de prosseguir em sua
caminhada. Será que foi o medo? A comparação? A procrastinação? O
perfeccionismo? O autoconhecimento é muito importante para esta reflexão. Ao
identificar estes padrões de comportamento, conseguimos então encontrar
maneiras de submetê-los às atitudes sadias.
Um texto que
recentemente me levou a refletir foi o de Moisés na sarça ardente. Quando
chamado por Deus para falar diante de Faraó, Moisés olhou para si mesmo e viu
impossibilidades. Ele disse:
"Quem sou eu para apresentar-me ao faraó e tirar os israelitas do Egito?" (Êx 3:11)
O que o Senhor respondeu?
Muitos dos discursos modernos envolveriam algo como: “Vai lá, Moisés, acredite
em si mesmo!” “Confie em seu potencial!” “Você consegue!”. Mas, Deus, em
contrapartida, responde:
“Eu estarei com você.” (Êx 3:12)
Existe algum
problema em não acreditar em si mesmo ou em procurar desenvolver uma boa
autoestima? Claro que não! O problema ocorre quando nos tornamos
autossuficientes e paramos de depender de Deus. Moisés, naquele momento,
precisava se enxergar como Deus o enxergava, para entender quem ele era à luz
do grande Eu sou (Êx 3:14). A capacidade que Moisés precisava vinha Dele,
e isso bastava. Em sua jornada, ele pôde entender tão claramente a importância
da presença de Deus que em outro momento de sua vida, quando o povo pecou ao
construir e adorar um bezerro de ouro e o Senhor disse que não estaria mais
diante deles e que enviaria um anjo, ele disse:
“Se a tua presença não for comigo, não nos faças sair deste lugar. Pois como se poderá saber que alcançamos favor diante de ti, eu e o teu povo? Será que não é o fato de andares conosco, de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da terra?” (Êx 33:15,16)
Moisés foi chamado
amigo de Deus, pois Deus falava com ele face a face (Êx 33:11). Foi pela fé que
ele recusou todos os tesouros do Egito e os prazeres transitórios do pecado,
preferindo ser maltratado com o povo de Deus, tendo em vista a recompensa. Foi
pela fé que ele saiu do Egito e prosseguiu sem vacilar, apesar da ira da maior
autoridade de seu tempo, pois contemplava o que era invisível (Hb 11:24-28).
Você pode perguntar:
“O que isso tem a ver com autossabotagem?” Diferentemente da realidade de
muitas pessoas que estão distantes de Cristo, nós temos um referencial, uma
esperança, uma identidade, e está Nele. Quando concentramos toda a nossa
energia em nós mesmos, podemos nos perder. Mas, Nele não. Porque Nele não há
mudança, nem sombra de variação (Tg 1:17). Ele é a nossa fortaleza, mesmo
quando nos sentimos fracos e vulneráveis. Ele é perfeito e conduz as nossas
vidas de acordo com seus perfeitos desígnios, apesar de nossos pecados e
limitações. Quando muitas vezes achamos que não somos, Ele é. E Ele diz quem
somos. Logo, não precisamos do julgamento das outras pessoas, nem muito menos
do nosso. O nosso veredicto já foi dado na cruz do Calvário, e é este: “Eu te
aceito através do meu Filho e Eu te justifico. Eu te amo de tal maneira que nem
o meu próprio filho neguei por você (Rm 8:32).”
Precisamos trazer à
nossa memória as verdades que já conhecemos e tomar posse delas, a fim de que gerem convicções em nosso coração. São as convicções, e não as emoções,
que devem nortear as nossas vidas.
“O problema não está nos acontecimentos, mas na maneira como reagimos a eles. É isso que o evangelho nos oferece. Ele transforma nossa mente, nos faz perceber a realidade de outro modo, reagirmos a ela de maneira apropriada à luz do evangelho, como também reestrutura nossas emoções e sentimentos. Mente transformada produz emoções redimidas e uma espiritualidade madura e equilibrada.”¹
Se necessário, busque ajuda, seja pessoal ou profissional, mas não se mantenha refém da autossabotagem. O problema não está em falharmos, visto que somos seres humanos, mas em permanecer nas falhas. Se seu problema é a procrastinação, mantenha seus alvos e objetivos bem claros, e sim, se planeje, com metas alcançáveis e mantenha o foco, mesmo quando não tiver desejo algum de cumpri-las. Se é perfeccionismo, entenda que a perfeição não existe além de Deus, e tudo bem com isso. Deus nunca exigiu perfeição de nenhum de seus seguidores, somente a fidelidade. Não seja tão exigente consigo mesmo a tal ponto de se prender ao que Deus não espera de você. Se é a comparação com outras pessoas, traga à sua mente a verdade de que sua identidade está em Deus e não se mantenha refém das pessoas. Ele já te deu o veredicto, se aposse dele. E assim por diante. Na força que o Senhor nos dá, conseguimos vencer tudo aquilo que possa atrapalhar a nossa caminhada enquanto peregrinos neste mundo. Seja paciente com seu processo, quem sabe Ele está trabalhando através dele para te fazer enxergar verdades espirituais e eternas e te levar para mais perto Dele? Que assim, avancemos dia após dia, no Senhor, para longe da autossabotagem.
¹ SOUSA. Anderson Barbosa de. Pensamentos transformados, emoções redimidas. Editora ultimato.
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Thayse Fernandes
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